Publicado em 12/04/20

As especiarias no combate à peste (as pandemias do passado)

peste

A maior epidemia de peste na Europa começou por volta da metade do século XIV e, por séculos, assombrou o continente, ceifando a vida de um terço da população europeia. Paris, Florença e Veneza, por exemplo, perderam mais da metade de suas populações.

A peste originou-se de uma bactéria que se instalava nos parasitas, assim como as pulgas que viviam em ratos e demais roedores. Cruel e perigosa, atacava silenciosamente, sem distinguir classe social, e manifestava-se de forma violenta e dolorosa. Afetava o sistema linfático, espalhando-se rapidamente e levando ao inchaço nos gânglios[1] de diversas partes do corpo. Febres altas e calafrios eram recorrentes e, em outras variantes da mortal doença, ocorriam manchas escuras na pele, o que deu origem aos termos peste negra e morte negra.

Pela inexistência de conhecimentos hoje considerados básicos sobre medicina, higiene e saúde pública, acreditava-se que a peste espalhava-se pelo ar e, como prevenção, queimavam-se ervas e especiarias como a noz-moscada, considerada a mais eficiente para purificar o ambiente. Com isso, o fascínio pelas especiarias cresceu ainda mais.

O aumento das cidades e das populações urbanas agravava as condições de higiene na Europa. As precárias condições sanitárias facilitavam a proliferação de ratos. Na capital do Império Bizantino, Constantinopla, a peste bubônica, que havia sido trazida por tribos invasoras, chegou a ceifar a vida de mais de 10 mil pessoas por dia[2]. Mais doenças significam, é claro, menos população e, portanto, menos contingente para o exército e para a manutenção das defesas, além de menor arrecadação de impostos.

Outro hábito terrível era o de se jogar os dejetos particulares pela janela. Em Lisboa, onde houve 132 surtos de epidemias no século XV, as águas sujas não poderiam ser lançadas na via pública sem alguns cuidados prévios: “de janela que seja em cima de casa, em rua pública, sem que primeiro se diga três vezeságua vai! ”, como descreve Eduardo Bueno em Passado a limpo – História da higiene pessoal no Brasil.

Acredita-se que durante toda a estada da armada de Cabral no Brasil, cerca de 10 dias, nenhum de seus homens banhou-se uma vez sequer nos rios ou no mar. Já os índios, notadamente os tupiniquins, eram extremamente asseados. Arrancavam todos os pêlos do corpo, pois assim, sem a pelagem, diferenciavam-se dos primatas. Também mantinham os cabelos cortados e tratados com ervas da mata, hoje tão popularizadas na nossa cosmética. Além disso, ingeriam e gargarejavam suco de caju e limpavam seus dentes com pó de juá.

texto do livro: Sabores e Destinos do prof. André Mafra

[1] O gânglio linfático inflamado chamava-se bubo, que deu origem ao termo peste bubônica. Acredita-se que a peste tenha surgido nos acampamentos mongóis que assediavam a antiga cidade de Caffa, atual Feodósia, na Ucrânia. Os genoveses que mantinham colônia comercial foram infectados e levaram a doença para Constantinopla e Itália, como ressalta Antonio Virgili, professor de história medieval da Universidad Autónoma de Barcelona, em seu artigo La peste negra.

[2] Cita John Hommer em Byzantium, the lost empire.

Crédito da imagem de capa: A peste em Winterthur em 1328 | Litografia de A. Corrodi, Crédito: Wellcome Library, Londres.

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Autor
Mafra lake

Andre Mafra

  Estudioso da área de culinária desde 2010, dedica-se a pesquisar e estudar sobre alimentação e especiarias. Realizou viagens aos… Continue lendo.

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